Justiça e Lesbianismo

Apresentamos um resumo da palestra de Yan María Yaoyólotl C.: “Justiça e Lesbianismo”. Se você deseja ler o texto integral, solicite para nós mulheres_rebeldes@hotmail.com ou diretamente para sua autora Yan@mujerarte.org

Essa palestra foi apresentada em agosto de 2006, na cidade de Zacatecas, México, durante FORUM DE ANÁLISE PARA PREVENIR E ERRADICAR A DISCRIMINAÇÃO – Conselho Nacional para a Prevenção da Discriminação. Yan explica que foi convidada como fundadora do Movimento de Lésbicas no México, mas não do movimento homossexual, nem do movimento lésbico-homossexual, (…)” pois isso ocorreu “em 1977, um ano antes da fundação do movimento homossexual” e que “sempre se manteve totalmente independente desse: duas provas disso são a realização das marchas lésbicas com um sentido totalmente diferente da gay parade e os Encontros Latino_americanos de Lésbicas”.

JUSTIÇA E LESBIANISMO

“É fundamental enfatizar que existe um antagonismo entre Diversidade sexual e Dissidência sexo-genérica, a primeira, é um movimento neo-liberal mercantil que responde aos ditames do livre mercado impulsionada pela globalização imperialista. O segundo, é um movimento social político e crítico que integra lesbianas, homossexuais, bissexuais, transgêneros e transexuais críticos e de esquerda, a que pertenço (…).
Pareceria que depois de 30 anos de luta teriam havido progressos extraordinários; que a situação das lésbicas agora é completamente diferente daquela “pré-história” do movimento; que hoje só falta afinar irregularidades ou omissões a respeito dos direitos civis, de trabalho e políticos das cidadãs lésbicas; (…) isto é uma ilusão, tal progresso é absolutamente relativo(…). Quando nos anos 70 (do século passado) afirmávamos: não buscamos a liberação das lésbicas dentro do capitalismo e, inclusive, mais além: nos negamos a aceitar a liberação lésbica dentro do capitalismo era porque entendíamos perfeitamente bem que no marco de um sistema econômico e político opressivo não era possível a liberação de nenhum ser humano. (…).
No entanto, durante essas últimas décadas de modelo econômico neo-liberal, o Mercado da Diversidade Sexual, MDS que constitui uma parte fundamental do dito modelo criou uma tecno-ideologia extremamente sofisticada em torno da sexualidade (queer, poli, s/m, pluri, metro, hard, adrenalina-sex, filias, SMS, etc.) como extensão fundamental do livre mercado. Ideologia promovida por muitos dos ex-ativistas do mesmo movimento GLTB que utilizam a comunidade sexo-genérica unicamente quando se trata de desenvolver e proteger seus negócios, líderes de opinião que promovem a ilusão de que já se goza de liberdade sexual porque se tem acesso a discos, roupas de marcas, hotéis, sex-shops, publicações, restaurantes, programas de TV e cinema e porque já se chegou ao Congresso e a postos públicos no governo, entre outras conquistas. (…).
Dentro desse marco de controle por parte do MSD sobre a sexualidade na lógica do livre mercado, a aplicação da noção de justiça ao setor social lésbico é algo totalmente incoerente(…).A colocação de alcançar justiça para as lésbicas dentro desse sistema social é um postulado totalmente capitalista, iniciativa que propõe a liberdade dentro da escravidão, para benefício de alguns. (…) o neo-liberalismo aprofunda de maneira brutal o abismo existente entre as classes sociais porque, mesmo que a classe política gay não queira ver, nossa sociedade está dividida em duas classe fundamentais: uma minúscula minoria que fundamenta seu poder sobre a mega exploração das grandes maiorias e as próprias maiorias que vivem submetidas a se mesmas.

Proposta do lesbianismo feminista re-evolucionário.
Frente a esse panorama, apresento uma proposta a partir de uma perspectiva lésbico-feminista re-evolucionária com relação à extensão da justiça ao setor de lésbicas s mexicanas.
A colocação da igualdade jurídica só será possível se ocorrer uma mudança de sistema social, uma mudança radical das estruturas que o compõe, isto é, se ocorrer a construção de um novo sistema econômico, político, social, cultural, sexual e espiritual que permita a construção de uma nova organização e estrutura interhumana que implique numa nova concepção do que deve ser a imparcialidade da justiça e a aplicação do direito.
Esta proposta –feita em um lugar tão institucional- pareceria uma colocação fora da realidade. Entretanto, essa iniciativa está sendo construída agora mesmo na Bolívia e na Venezuela, sem esquecer que foi a proposta que inspirou os projetos socialistas a nível mundial na primeira metade do século XX e que hoje mesmo está impulsionando o movimento zapatista, em nosso próprio país, através da iniciativa da Nova Constituinte.
Constituinte que consiste precisamente em reorganizar nossa nação de outra maneira, de uma forma que represente os interesses, não dos grupos que dominam e exploram a nação de maneira predatória e genocída, mas que represente o interesse das maiorias, e das minorias, de mexicanas e mexicanos, onde se incluem, certamente, as lésbicas.
Obviamente, essa iniciativa supõe uma transformação substancial que se choca com os interesses econômicos da oligarquia que domina nosso país (da qual fazem parte as empresas para gays e atualmente os empresários gays), ademais de chocar-se com os interesses das multinacionais (da qual faz parte o MDS), particularmente do imperialismo norte-americano. A todos eles também nos confrontamos as lésbicas de esquerda.
Tanto a justiça como o direito, só e unicamente podem ser possíveis em um sistema de igualdade econômica, política e social, portanto, falar exclusivamente de “igualdade social” (como fazem os ideólogos gays) sem falar de igualdade econômica e política constitui uma contradição absoluta. No México isso não existe logo não se pode falar de justiça, talvez de uma “justiça totalmente injusta”, de um aparato de justiça e de uma legalidade impostos por alguns para manter as maiorias submetidas, sob a aparência do conceito sagrado de democracia burguesa.
“Desde o desenvolvimento da democracia norte-americana dos anos 20 do século XIX (Jacksonian Democracy) a idéia de democracia estava inseparavelmente unida às categorías de “propriedade privada”, “individualismo” e “economia de mercado capitalista” (Chomsky, Dieterich, p. 145). Propriedade privada (na minha cama mando eu), individualismo (meu prazer e meu orgasmo, seja com quem for e por todos os meios possíveis) e livre mercado (o ideal de todo o gay é chegar a ser empresário) constituem os princípios sobre os quais se constrói a cultura gay burguesa e o Mercado da Diversidade Sexual.
É precisamente dentro desse contexto que se deve colocar a opressão social e a repressão sexual (….) que atualmente chama-se: discriminação sexual ou de gênero. No entanto, as análises dos teóricos, acadêmicos ou ideólogos capitalistas ou pro-capitalistas aglutinados na direita intelectual gay, reduzem a discriminação sexual à mera manifestação ideológico-cultural, sem colocá-la como parte da engrenagem da economia política capitalista patriarcal e imperial e, em conseqüência, se limitam a impulsionar uma série de leis para estender os direitos civis, trabalhistas e políticos sem questionar o problema de fundo. Sem questionar a estrutura econômico-política do sistema. Essa lógica converte a classe gay política em cúmplice do dito sistema.
Mudar a raiz do sistema, significaria reconstruir a sociedade mundial sobre bases sociais não opressivas mas apoiadas na colaboração, cooperação, solidariedade, contribuição, trabalho mútuo, crescimento conjunto e bem comum, entre outros; superando as relações de opressão, controle, dominação, conquista, submissão, invasão repressão, extermínio (Palestina, África, Chiapas), etc., todas elas sustentadas na exploração de uns sobre outros, o que constitui a essência do patriarcado. Inimigo fundamental que combatemos as lésbicas feministas (mas não os e as gays).
Hoje, falar nestes termos resulta ridículo ante uma devastadora ideologia neo-liberal que nos roubou a capacidade de transformar nossa própria realidade com se essa fosse um destino imutável, um capitalismo invencível; que nos despojou de nossa fé na possibilidade de desenhar criativamente novos modelos de organização social não opressiva, como se a divisão social em classe fosse imutável, um destino fatal. Em síntese, ideologia que nos faz crer na incapacidade dos povos, da classe trabalhadora, das mulheres, entre outras, de modificar a realidade. Realidade que unicamente os donos do dinheiro (os apropriadores da riqueza social) podem modificar: Bush ou Israel podem modificar a realidade geopolítica internacional a seu gosto sem se importar com o extermínio massivo de seres humanos.
Esse destino inexorável, que está afiançado, avaliado e fortalecido pela classe político-empresarial gay aunado à classe político-empresarial das generistas (ex-feministas ou feministas de direita) e pela esquerda oportunista, IO. Essa situação só pode ser transformada pelo povo, pelo Terceiro Mundo (nova concepção do Terceiro Mundo), pela classe trabalhadora, pelos indígenas, pelos trabalhadores agrícolas, pelos operários, pelas mulheres, pelos sem terra, pelos desempregados, pelos ançiãos e particularmente pelas lésbicas feministas.
O processo de construção da sociedade futura justa é possível aqui e agora e não em um “futuro distante” ou “até a tomada do poder”. Prova disso são as comunidades indígenas autônomas zapatistas que estabeleceram seus próprios governos e sua própria administração assim como sua própria aplicação de justiça, aqui e agora em Chiapas no sudeste mexicano.
Quando um Estado governa através da injustiça: a imposição (governador de Oaxaca), a repressão (Atenco), a corrupção (fraude eleitoral), a impunidade (Ciudad Juárez), a mentira (sistema bancário e financeiro), etc., (…) o povo tem todo o direito de desconhecer esse governo e de buscar seus próprios sistemas de justiça.
Sem aludir às utopias, mas ao socialismo-feminista “cientifico” e em particular ao lesbo-feminismo, a humanidade tem seus dias contados para uma transformação radical. Não apenas porque o planeta já não pode mais resistir ao aquecimento que as multinacionais geraram com sua contaminação, nem a pode terra suportar a devastação e depredação que essas empresas produziram, mas também pelo extermínio e anquilação massivos de grandes setores da humanidade através de enfermidades, do álcool, das drogas, do sexo compulsivo (MDS), dos programas televisivos de alienação mental, dos transgênicos, da manipulação genética, dos alimentos chatarra1, etc., impulsionados pelos governos capitalistas.
Hoje, o movimento lésbico-feminista assim como ao movimento da Dissidência sexo-genérica, MDG, nos cabe participar da reconstrução do planeta e da sociedade humana destruída pelo sistema heterosexista-patriarcal / capital-imperialista do qual são hoje pontuais o MDS e a cultura gay direitista, até a construção de uma sociedade totalmente livre da opressão social já que “ninguém será livre até que todas e todos sejamos livres”.
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LESBIANAS FEMINISTAS RE-EVOLUCIONARIAS.
Yan María Yaoyólotl C.
lesbofeminismoyan@yahoo.com.mx
es.geocities.com/lesbofeminismoyan/lesb...
Yan@mujerarte.org
1 Alimentos chatarra são comidas rápidas artificiais e sem valor nutritivo.