problematizando o "Lésbica Futurista" de GA31

problematizando a música

PROBLEMATIZANDO “LÉSBICA FUTURISTA

Tem feito muito sucesso, em baladas e na internet, a personagem “GA31”, sobretudo sua música “Lésbica Futurista”. O primeiro problema que eu quero ressaltar a respeito disso é sobre o cérebro por trás da personagem – um homem. Eu já desconfiava disso, porque a letra se assemelha muito mais com a cultura gay/travesti do que com qualquer discurso lésbico (“eu não vou deixar a inveja me abalar”, por exemplo) e pesquisando sobre o projeto GA31 encontrei referências a “o produtor CMS”. Ele não revela o nome, talvez não queira que fique tão evidente que de lésbica GA31 não tem nada. Um homem NUNCA vai saber o que é ser lésbica, e é muito grave que deixemos um homem falar por nós. Se nós já temos pouco (íssimo) espaço na mídia, ter uma “representação” falsa é pior do que não ter representação nenhuma. Porque não é uma lésbica falando sobre a lesbiandade, é um homem falando sobre isso, e é óbvio que um homem só pode ter uma visão estereotipada, idealizada e fetichizada sobre o que é ser lésbica. Reafirmo aqui que é IMPOSSÍVEL um homem fazer a menor idéia do que significa ser lésbica. Prova disso são os clipes, que exibem imagens de mulheres padronizadas, magérrimas, brancas e performando (muita) feminilidade – corpos femininos muito bem adaptados ao padrão de beleza imposto pelo patriarcado – e que obviamente objetiva agradar aos homens.

Outro ponto, que considero gravíssimo e extremamente problemático, é o trecho que diz “lésbicas / putas / lésbicas / sem culpa”. Isso é tão absurdo que eu mal acredito que eu preciso falar isso. “Lésbicas putas”?! A palavra “puta”, em português brasileiro, sempre foi um xingamento absolutamente misógino, e essa palavra não deve ser ressignificada, ela é uma palavra negativa, é uma ofensa, é um xingamento enfim. Como não ver problema nisso?! Somos putas porque somos lésbicas? Pela Deusa né.

Por fim, quero problematizar a parte final da letra, que diz “Lésbicas rumo a nova era /De classe, elegância, amor e tesão”. Primeiro, que nova era? A palavra “lésbica”, em uma manobra muito inteligente do patriarcado, vem sendo deturpada, objetivando nos enfraquecer politicamente. Lesbianismo não é rolê, não é diversidade, é resistência contra o patriarcado. Ser lésbica é priorizar as mulheres e negar o falocentrismo. Nós, lésbicas, não estamos rumando a uma nova era de classe, elegância, amor e tesão. Nosso amor sempre foi e sempre será direcionado às mulheres. Nosso tesão sempre foi e sempre será despertado pelos corpos femininos – qualquer coisa diferente disso não é ser lésbica. Como disse Adrienne Rich, “Antes que existira ou pudesse existir qualquer classe de movimento feminista, existiam as lésbicas, mulheres que amavam a outras mulheres, que recusavam cumprir com o comportamento esperado delas, que recusavam definirem-se em relação aos homens, aquelas mulheres, nossas antepassadas, milenares, cujos nomes não conhecemos, foram torturadas e queimadas como bruxas.” Questiono também a parte principal da letra, “lésbica futurista, sapatona convicta”. O que seria uma lésbica futurista? A partir dos discursos queer, concluo que nós, que amamos mulheres e somente mulheres, seríamos as lésbicas ultrapassadas, que deverão ser substituídas pelas lésbicas futuristas (que são sapatonas com convicção, mas sem provas).

Ruana Piber

   

na verdade esse lance de ‘lésbicas putas’ é mais dentro da idéia de libertação sexual, revolução sexual, é dentro da idéia liberal de sexualidade que reivindica vadia como termo libertador e etc…