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As inglesas que usaram o jiu-jítsu para lutar pelo direito ao voto

BBC
24/12/201512h30

No início do século 20, um grupo de britânicas desafiou o establishment para reivindicar o direito ao voto para as mulheres. Em sua luta, as militantes sofreram violência e intimidação. Até que, incentivadas por uma diminuta -e determinada- mulher chamada Edith Garrud, aprenderam a “bater de volta”.

Edith Garrud tinha um metro e meio de altura. Aparentemente, não era páreo para os oficiais da Polícia Metropolitana de Londres. No entanto, Edith tinha uma arma secreta: ela era formada na arte marcial japonesa jiu-jítsu.

Nos anos que precederam a Primeira Guerra Mundial, ela se tornou instrutora de jiu-jítsu da União Social e Política das Mulheres (WSPU, na sigla em inglês).

O grupo, que acabou conhecido como as suffragettes (sufragistas), protagonizou um movimento cada vez mais violento pelo direito ao voto feminino.

Frustradas pela falta de resultados em sua campanha, recorreram à desobediência civil, a passeatas e atividades ilegais, incluindo agressões físicas e incêndios de propriedades.

À medida que a guerra se aproximava, os confrontos ficavam mais violentos. As militantes eram presas e, quando faziam greve de fome, eram alimentadas à força por meio de tubos de borracha. Quando saíam em passeatas, muitas se queixavam de ser empurradas com brutalidade e jogadas no chão.

A situação viria a piorar. No dia 18 de novembro de 1910, um grupo de 300 sufragistas se deparou com uma corrente de policiais na entrada do Parlamento britânico, em Londres.

Em desvantagem numérica, foram agredidas pela polícia e por civis homens que estavam no meio da multidão.

Muitas das manifestantes sofreram ferimentos graves e duas morreram. Mais de cem sufragistas foram presas.

“Várias disseram ter sido bulinadas pela polícia e por homens que estavam no local”, disse Elizabeth Crawford, autora do livro The Women’s Suffrage Movement: A Reference Guide, um guia de referência sobre o tema. “Depois disso, as mulheres nunca mais saíram para fazer manifestações sem estar preparadas.”

Algumas começaram a colocar proteções de papelão sobre os quadris. Mas Edith Garrud já estava ensinando as colegas da WSPU a “bater de volta”. Seu método, a milenar arte marcial jiu-jítsu, se baseava no uso da força do agressor contra ele próprio, canalizar a energia do movimento do outro e atingir o agressor em pontos específicos.

O primeiro contato das sufragistas com o jiu-jitsu aconteceu durante uma reunião da WSPU. Edith e seu marido, William Garrud, tinham uma escola de artes marciais no bairro do Soho, em Londres. William tinha sido contratado para dar a aula, mas estava doente, então Edith foi sozinha.

“Normalmente, Edith fazia as demonstrações e William falava”, disse Tony Wolf, autor da trilogia de quadrinhos Suffrajitsu. Ilustrados pelo brasileiro João Vieira, os livros exploram esse aspecto curioso do movimento das sufragistas.

“Mas segundo consta, a líder da WSPU, Emmeline Pankhurst, incentivou Edith a falar —e foi isso o que ela fez”, contou Wolf.

Edith tornou-se instrutora de algumas das integrantes do movimento. “Naquela época, o objetivo era que elas pudessem se defender de pessoas agressivas que saíam da plateia e subiam no palco (durante comícios ou palestras), não necessariamente da polícia”, disse o escritor. “Tinham ocorrido várias agressões.”

Por volta de 1910, Edith já dava, regularmente, aulas exclusivas para as suffragettes.

Em um artigo que escreveu na época para o jornal da WSPU, Votes for Women, ela enfatizou que o jiu-jítsu era perfeito para a situação em que a WSPU se encontrava, ou seja, ter de lidar com uma força maior e mais poderosa como a polícia e o governo.

A imprensa percebeu. A revista Health and Strenght publicou uma sátira intitulada jiu-jítsuffragettes. A revista de humor Punch publicou uma charge que mostrava Edith em pé, sozinha, diante de vários policiais. O titulo do cartoon era A suffragette que sabia jiu-jítsu.

O termo “suffrajitsu” passou a ser usado com frequência.

“Eles não esperavam, naquela época, que mulheres pudessem responder fisicamente àquele tipo de agressão e, muito menos, oferecer resistência efetiva”, disse Martin Dixon, presidente da British Jiu-Jitsu Association. “Era a maneira ideal de as mulheres lidarem com situações em que eram agarradas no meio de uma multidão.”

Os Pankhurst -família de militantes políticos britânicos que liderou o movimento das sufragistas- passaram a incentivar todas as integrantes do movimento a aprender a arte marcial. “A polícia sabe jiu-jítsu. Eu aconselho vocês a aprenderem jiu-jítsu. As mulheres devem praticá-lo, assim como os homens”, disse Sylvia Pankhurst, filha de Emmeline, em um discurso feito em 1913.

Com os passar dos anos, os confrontos entre polícia e sufragistas ficaram mais intensos.

Em 1913, o governo britânico baixou o chamado Cat and Mouse Act (Ato do Gato e Rato, em tradução livre). A nova lei permitia que prisioneiros em greve de fome fossem libertados e, assim que sua saúde se recuperasse, presos novamente.

“A WSPU achava que (sua líder, Emmeline) Pankhurst tinha um papel tão importante como motivadora e porta-voz da organização, que não podia ser recapturada”, disse a autora Emelyne Godfrey.

Emmeline precisava de proteção, então Edith formou um grupo chamado de “guarda-costas”: até 30 mulheres encarregadas de “tarefas perigosas”.

“Às vezes, recebiam apenas uma ligação telefônica com instruções para que seguissem um determinado carro.”

Apelidadas de Amazonas pela imprensa britânica, as “guarda-costas” se armavam com pedaços de pau escondidos em seus vestidos.

Elas foram muito úteis durante a famosa “Batalha de Glasgow”, no início de 1914. O grupo viajara de Londres, durante a noite, de trem, para a cidade escocesa. Os pedaços de pau causavam desconforto durante a jornada.

Uma multidão esperava para ouvir Emmeline Pankhurst discursar, mas a polícia havia cercado o prédio, na esperança de prendê-la, mas Pankhurst conseguiu despistá-los.

Então, as “guarda-costas” se posicionaram, sentando-se em semicírculo atrás do pódio. De repente, Pankhurst apareceu e começou a falar. Meio minuto depois, a polícia tentou invadir o palco, mas ficou presa em um arame farpado escondido em buquês de flores.

“Então, cerca de 30 sufragistas e 50 policiais travaram uma batalha no palco, na presença de 4 mil pessoas, durante vários minutos”, disse Wolf. No final, a polícia conseguiu dominar o grupo e Pankhurst foi presa novamente. Mas a dificuldade em arrastá-la para fora do local demonstrou quão eficientes as “guarda-costas” haviam se tornado.

Edith Garrud não havia ensinado apenas recursos físicos às sufragistas. Elas também tinham aprendido a enganar seus oponentes.
Em 1914, Pankhurst fez um discurso na sacada de uma casa em Camden Square, no norte de Londres.

Quando saiu da casa coberta por um véu, escoltada pelas colegas, a polícia entrou em cena. Apesar de resistir, ela foi jogada ao chão e arrastada para fora, inconsciente.

Mas quando os policiais, triunfantes, tiraram o véu que cobria a prisioneira, perceberam que tinham sido enganados. No meio da confusão, a verdadeira Pankhurst tinha sido retirada do local, às escondidas.

A ênfase do jiu-jítsu no uso da astúcia para derrotar um oponente maior foi o que primeiro impressionou Edith nessa arte marcial.

Ela tinha sido apresentada à técnica em 1899, ao acompanhar o marido William a uma feira de artes marciais.

Logo, Edith tornou-se uma das primeiras instrutoras de artes marciais do Ocidente. Em demonstrações públicas durante eventos, ela vestia um quimono vermelho e convidava algum praticante de jiu-jítsu, vestido de policial, a atacá-la.

“No que diz respeito às suffragettes, Edith estava no lugar certo na hora certa”, disse Wolf. “O jiu-jítsu tinha se tornado uma nova mania (no país), com mulheres organizando festas nas quais faziam aulas com as amigas.”

Edith e suas alunas continuaram sua luta pelo direito ao voto até que uma outra batalha, muito maior, tomou conta de todos os britânicos. Quando estourou a Primeira Guerra Mundial, as sufragistas se concentraram em dar apoio ao esforço de guerra.

No final da guerra, em 1918, o governo baixou uma lei dando a mais de 8 milhões de mulheres no Reino Unido o direito ao voto. No entanto, as britânicas só viriam a conquistar direitos eleitorais iguais aos dos homens em 1928.

Com o passar do tempo, as “guarda-costas” e sua instrutora caíram no esquecimento. “Foram as líderes (do movimento pelo voto feminino) que escreveram os livros e contaram a história”, explicou Crawford.

As histórias dos que as ajudaram tinham menos chance de ser incluídas nesses relatos.

Um filme sobre o tema, As Sufragistas, estrelado pelas atrizes Carey Mulligan, Meryl Streep e Helena Bonham Carter, estreia no Brasil nesta quinta-feira.

Edith Garrud não aparece no filme mas, em homenagem a ela, Bonham Carter mudou o nome de seu personagem. Inicialmente, ele deveria se chamar Caroline, mas passou a ser Edith.

Ela foi “uma mulher incrível”, cujo método de lutar não se valia de força bruta, disse Bonham Carter. “Era uma questão de habilidade.”
E foi na base da habilidade que as suffragettes enfrentaram oponentes poderosos.

Durante uma entrevista em 1965, Edith Garrud se lembrou de um episódio em que um policial tentou impedir que ela fizesse um protesto em frente ao Parlamento.

“Saia daqui, você está obstruindo a passagem”, disse o policial. “Com licença, quem está causando obstrução é você”, respondeu Edith. E com um movimento rápido, jogou o policial por cima do ombro.

   

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